10/02/2009

‘Religião contra o amor não presta’

A afirmativa é do autor d‘O Armário’, Fabrício Viana, presença no Encontro sobre Homoerotismo

Para muitos, ele é polêmico; para outros um escritor, que fala a linguagem contemporânea, contrário a intolerância religiosa e exclusão dos homossexuais na sociedade. Pela segunda vez no Encontro da Nova Consciência, o escritor e ativista gay Fabrício Viana, 31, autor do livro 'O Armário', será um dos nomes mais badalados do evento paralelo - Encontro sobre Homoerostismo. Participam do encontro, o professor da Universidade Estadual da Paraíba, Adriano Barros, com a palestra "Homossexualidade, Escola e Preconceito: a construção social das diferenças" e o bacharel em Filosofia pela USJT e membro da MENSA, Alexey Dodsworth, que debaterá sobre "Homossexualidade: herança genética ou construção psíquica?" O Encontro sobre Homoerotismo acontecerá no domingo de carnaval, no CEDUC 2, a partir das 14h. Na entrevista que segue, Fabrício Viana fala sobre a mídia, o movimento gay e como o preconceito das religiões pode ajudar a fazer alguém infeliz.

O que pensa acerca das diferentes posições religiosas relativamente à homossexualidade?
Sou ateu. E como tal não vejo motivos para que um homossexual faça parte de uma religião que condena aquilo que lhe da prazer, novamente não falo só do sexo, mas sim do companheirismo, do deitar-se com outro homem. De construir um relacionamento estável. Afetivo. Isso é amor. Uma religião que é contra o amor na minha visão não presta. Ainda bem que hoje em dia existem Igrejas inclusivas. Onde as leituras sagradas são re-interpretadas e a homossexualidade é aceita. Ainda não servem para mim e nunca vai existir nenhuma. Mas acho que a base de tudo é o respeito.

Na sua opinião, como a homossexualidade é vista no país? Embora tenhamos paradas gays, visibilidade, muitas pessoas se assumindo com mais facilidade, o preconceito ainda existe, é grande e mata. Homofobia mata. Muitos que não entendem a homossexualidade acabam tentando destruir no outro aquilo que incomoda dentro de si. Eles fazem palestras contra a homossexualidade, a enxergam como uma doença e um pecado divino. Quando na verdade nunca foi e nunca será. A ciência esta ai justamente para provar isso. As pessoas e a sociedade só precisam de mais informações sobre o tema. Isso incluem também jornalistas, a imprensa, principalmente, afinal, eles também são comunicadores e formadores de opiniões. Precisam entender não só a homossexualidade, mas a sexualidade humana. Coisa que poucos entendem. 
Como o senhor lida com a sua homossexualidade no dia-a-dia? Hoje, tranquilamente. Amigos, vizinhos e colegas de trabalho, todos sabem e isso não muda em nada o meu dia-dia. Quem não gostava de mim, continua não gostando. Quem gostava, continua gostando. Pouquíssimas pessoas se afastaram ou se afastam. E para mim isso é uma grande vantagem, pois a vida é minha e a prioridade é a minha pessoa, meus desejos e minha felicidade plena.

Como o preconceito contra a pessoa homossexual se manifesta na sociedade brasileira? Desde um simples olhar discriminativo até a agressão e morte. Muitos se dizem não se importar com a homossexualidade desde que seja longe de sua família. E ai mora o problema, pois muitas famílias têm alguém homossexual ou bissexual internamente (sem saberem). E como lidar com isso? Ai mora o problema, pois eles simplesmente não sabem. E quando se dão conta, também discriminam. O maior preconceito vem mesmo de dentro de casa.

Como o preconceito pode interferir na qualidade de vida dessas pessoas?
Quando você não respeita a diferença e a individualidade do outro, seja quem ele for, você perde possibilidades de conhecer este "ser diferente". De aprender coisas novas. Se eu sou heterossexual e só tenho amizades com heterossexuais, eu perco uma gama gigantesca e valiosa de conviver e conhecer homossexuais. Não significa se envolver sexualmente com eles. Mesmo porque homossexualidade não é sinônimo de sexo. Ninguém, nem heterossexuais, fazem sexo 24h por dia. Muito menos homossexuais. A base é a troca. Por isso, do outro lado, os homossexuais também perdem com o preconceito dos outros.

Você publicou "O armário" que fala sobre como foi o processo de "saída do armário" e está lançando um segundo, que relata, de forma ficcional, experiências sexuais vivenciadas pelos personagens. 
"O Armário" é um livro educacional e quase técnico, mas com linguagem simples para que possa ser entendido por todos. Já o segundo livro é uma obra de ficção, uma história baseada em várias histórias que escuto por ai. O protagonista, que se chama Junior, é do interior de São Paulo, descobre a homossexualidade com um amigo, é pego por seu pai e expulso de casa. Depois ele é internado em uma clinica de recuperação de homossexuais. Aquelas fazendas religiosas que convertem gays para ex-gays. O Junior, quando descobre, foge e vai parar em São Paulo onde acaba morando com um casal chamado Marcos e Michelly. Daí para frente ele faz um resgate com seu passado, com tudo o que aconteceu na clínica e com os outros personagens do presente. Apesar de ser ficção, o "Prometheus" entra em várias questões como o casamento (tanto heterossexual quanto homossexual), relacionamento aberto, dentre outros. O lançamento esta previsto para este ano.

Quais são as suas expectativas para participar da 18º edição do Encontro da Nova Consciência?

Embora ainda esteja no processo de finalização do segundo livro, espero curtir mais o Encontro, passar informações bacanas, trocar experiências e também me inteirar dos eventos. Quanto mais puder passar e explicar sobre a homossexualidade, em todos os seus aspectos, melhor. Afinal, porque a homossexualidade tem a ver com o Encontro da Nova Consciência? Porque antes de tudo, somos seres humanos e como tal precisamos não só sermos respeitados como compreendidos. Essa é a nova consciência, uma consciência inclusiva e que promete ajudar a todos na construção de um mundo melhor. 
Com tantos personagens homossexuais nas telenovelas, a publicação de várias revistas homoeróticas e a luta pela aprovação do projeto PLC 122 que criminaliza a homofobia, você acredita que o momento atual é bom para os homossexuais? 
Nem um pouco. Esta melhor, mas ainda não. Homossexuais nas novelas ainda são caricatos, esquisitos e não podem beijar na boca. E quase ninguém percebe. Você já reparou que personagens homossexuais na Rede Globo tem diminutivo no nome? Sandrinho, Bernardinho, Orlandinho e por ai vai indo. Dias destes escutei que a novela "Três Irmãs" terá personagens gays apenas porque o ibope estava baixo. É uma tentativa de aumentar a audiência. Ridículo. Eles colocam os homossexuais na mídia justamente para mostrar como "eles são esquisitos". Só isso. Do outro lado temos a militância homossexual que, segundo uma recente crítica publicada no site da A Capa, esta preocupada apenas em debates, congressos e financiamentos do governo. Claro que não é todo o movimento, mas ainda existe uma desorganização e um mal estar pela luta dos direitos dos homossexuais.


fonte: http://db.onorte.com.br/terca/cultura/

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